A ideia fundamental da solidariedade na Europa radica numa dupla dimensão: a moral, de matriz kantiana, em que a União Europeia se propõe agir de acordo com um princípio geral universalizável, visando um nível mínimo aceitável de coesão (social e económica) que possa ser exemplo também nas relações internacionais; e a política (...da integração), que advoga ser indispensável reduzir as distâncias de desenvolvimento entre Estados, regiões e cidadãos, para construir uma verdadeira Comunidade, um Mercado Comum eficaz.
A ideia surge já no Tratado de Roma, que refere, no seu preâmbulo, a redução das desigualdades de desenvolvimento entre regiões. Ao longo dos anos, foi-se reforçando a convicção da importância da coesão económica e social, a qual veio a constar no Ato Único Europeu, de 1986, como objetivo e, em Maastricht, finalmente, como política. A sua concretização baseia-se na política regional e os seus principais instrumentos são os fundos estruturais, em particular, o Fundo Europeu de Desenvolvimento Regional (o FEDER), cuja origem remonta a 1975, por via da aplicação do princípio das competências implícitas e do artigo 308º do Tratado da União (versão pós-Maastricht). O FEDER veio complementar a política social, que nos Tratados originais tinha o seu principal suporte no Fundo Social Europeu, criado em 1957, aquando da criação das originais Comunidades Europeias.
Muito mais tarde, já nos anos 80 e sob a pressão da adesão de novos países, com níveis de desenvolvimento muito inferiores à média comunitária (era o caso da Grécia, mas também de Portugal e Espanha, ao aderirem em 1986) veio ainda a ser criado o Fundo de Coesão, de que beneficiaria também, durante um certo tempo, a Irlanda. Redes de comunicação e projetos ambientais eram os principais objetos desse Fundo, complementar dos então existentes e cujo escopo era, sem dúvida, a consolidação de uma coerência europeia indispensável ao bom prosseguimento da construção da União.
Na prática, a coesão económica e social, assim formulada, exprime de forma clara a solidariedade entre as regiões da União, dos seus Estados e cidadãos. Mas a palavra solidariedade tem múltiplos outros sentidos e é usada a inúmeros títulos na União Europeia: um dos mais recentes respeita ao Fundo de Solidariedade criado por Regulamento de 11 de novembro de 2002 (CE n.º 2012/2002), que expressamente refere a coesão económica e social como premissa básica para a ideia da solidariedade. Este Fundo visa responder com eficácia e flexibilidade a situações de emergência para com populações vítimas de catástrofes naturais de grandes dimensões no espaço comunitário. Pode pois dizer-se que a solidariedade é a expressão suprema de um dos mais importantes valores da construção europeia, o da coesão e coerência de um projeto de paz entre povos e regiões baseado num desenvolvimento equilibrado, na redução das diferenças estruturais entre regiões e na promoção de uma verdadeira política de igualdade de oportunidades para os cidadãos europeus.
Sendo certo que a coesão económica e social se revelou bastante bem sucedida durante muitos anos na redução das, por vezes substanciais, diferenças de desenvolvimento entre os Estados-Membros, é também verdade que nunca como agora a solidariedade efetiva foi posta em causa: o alargamento a 25, a 27 e a 28 fez diminuir significativamente o PIB médio por habitante da União Europeia e multiplicou por dois as disparidades regionais que existiam à data da UE a 15. O desafio está lançado e as dificuldades para concretizar a solidariedade, desde logo na determinação das perspetivas financeiras e na aprovação dos orçamentos, que a consubstanciam, não deixarão de aumentar.
A concluir, proponho o seguinte corolário: sem solidariedade, sem coesão económica e social, sem coerência entre regiões e povos, a União dificilmente terá viabilidade. E isto nada tem a ver com o decantado modelo social europeu. Isto tem a ver com uma lógica de integração, pura e simples, e com valores, os valores da Europa num Mundo conduzido por objetivos materiais e por ideais nacionalistas por vezes redutores e eivados de reminiscências de outras eras.